Elon Musk tirou uma pausa de fazer campanha para Donald Trump e apresentou enfim os seus planos para taxis autônomos, e apesar de todos os fãs celebrarem em uníssono a vitória do seu líder, o resto do mundo (particularmente os investidores) não viram o mesmo porque a seguir à apresentação as acções da Tesla caíram 9% e as da Uber e Lift subiram 10% (bem como todo o mercado). Em termos de conteúdo feste evento da Tesla foi muito pobre (foi mais a apresentação de um conceito de um plano) e aparentemente muito foi completamente encenado. E até datado - o que foi demonstrado seria certamente pioneiro há 10 anos atrás.
Tesla Cybercab e Rebôvin
Comecemos pelo Tesla Cybercab, que suspeito ter sido o resultado de cruzar o Volkswagen XL1 com um pouco de Cybertruck. Leva apenas 2 passageiros, não tem volante ou pedais, o carregamento será por indução e segundo Musk a produção arrancará em 2026 e custará abaixo dos 30.000 dólares.
Confesso que até era atraente, mesmo aquela mistura dos tampões de rodas e parede lateral do pneu pintada na mesma cor dourada que lhe dava um look muito art déco. Cada cybercab transporta 2 passageiros e bastante bagagem, o que faz sentido já que a maioria dos taxis transporta apenas 1 ou 2 passageiros de cada vez. Mas se notarem nas imagens a distancia ao solo é pequena e os pneus muito grandes o que significa que apenas funciona em estradas perfeitamente lisas e alcatroadas. Há também o problema do acesso ao interior que não foi feito a pensar em pessoas com cadeira de rodas ou de mobilidade reduzida, o publico que mais tem a ganhar com a condução autônoma.
Depois há a questão do preço anunciado por Musk: menos de 30.000 dólares. E claro que não ira custar isso, nem perto desse valor. Para referencia, um muito mais pequeno Kia Picanto anda nos 20.000 euros. Também disse que a produção dos CyberCab ira arrancar nos próximos 2 anos, que tomando em conta o longo histórico da Tesla cumprir datas certamente este também não via ser atingido. Outro pormenor é a carga por indução - apesar de fazer sentido isso significa viaturas paradas durante horas em múltiplos locais de carga. Tendo em conta que a Tesla já tinha anunciado há anos a possibilidade de troca de bateria (algo já feito na China em taxis) porque não fazer o mesmo com o CyberCab?
E depois temos a Rebôvin, que parece o nome de um medicamento, mas por debaixo daquele design de torradeira retro art déco é um mini autocarro autônomo de 20 lugares. E tal como o Cybercab tem uma distancia ao solo tão pequena que certamente iria ficar presa na primeira lomba de velocidade que encontrar.
Mas o maior problema, para ambos CyberCab e a Rebôvin, é que Musk não deu qualquer informação sobre a tecnologia como autonomia, sensores usados, medidas de segurança, configurações possíveis, melhorias do FSD ou como que seriam comercializados aos consumidores/operadores.
Curiosamente ele também disse que para o ano (é sempre para o ano) os Tesla model 3 e Y vão poder conduzir completamente autônomos no Texas e Califórnia - além de existirem múltiplas barreiras legais que não dependem das vontades de Musk...onde raio ficaram o S e X?! E a há muito prometida possibilidade de proprietários de veículos a Tesla operarem os seus Teslas como taxis autônomos?
Tendo em conta o histórico de Musk cumprir os seus próprios objetivos...esperemos para ver, mas seriamente duvido. Musk não referiu como espera em menos de 2 anos arrancar a produção em massa e ultrapassar todas as barreiras legais que concorrentes como a Waimo ou o GM Cruise tiveram que passar antes de se fazerem à estrada. São precisos anos para assegurar a segurança e fiabilidade do serviço e a única coisa que para já demonstraram foi alguns protótipos a circularem num cenário da Warner Bros onde estiveram semanas a mapear e coreografar o percurso...tal como fizeram no celebre vídeo de demonstração do FSD.
A Tesla está a tentar seguir uma opção mais barata (FSD), mas com sérios pontos fracos - segundo a Reuters o software AI de condução da Tesla não permite determinar a razão de um acidente ou de qualquer outro incidente/falha (importante para fins de regulamentares). O “computer vision” do FSD da Tesla usa camaras como olhos e inteligencia artifical chamada "End-to-end machine learning" que traduz "o que vê" em decisões de condução - mas é um sistema de caixa negra, em que toma decisões da informação sem passos intermédios de programação ou engenharia. E se não és capaz de identificar as falhas que causaram os problemas é quase impossível precaver tais situações.
O software da Tesla está anos atrás dos rivais como a Waimo, ainda exige atenção constante do condutor e está a ser investigado em vários acidentes mortais - incluindo um de há poucos dias em que atingiu um carro da policia parado. A National Highway Traffic Safety Administration (NHTSA) publicou uma investigação em abril em que detetou entre janeiro de 2018 e agosto de 2023 542 acidentes com 14 fatalidades com veículos da Tesla com Autopilot ou FSD ativos.
E depois há o hardware - a concorrência também usa câmaras e inteligência artificial como a Tesla, mas adicionam uma outra camada de hardware (Lidar, radar e outros sensores) e software (mapeamento de alta definição) como segurança. A Waimo anda nisto há mais de uma década (desde 2009) lentamente a melhorar o seu sistema, e mesmo assim estão limitados a determinadas áreas e proibidas de circular em vias rápidas. Este hardware adicional é critico para aqueles cenários que o software não consegue antecipar.
A ideia que a Tesla será capaz de apanhar a concorrência em 2 anos é ridícula apenas no campo tecnológico, mesmo se não contarmos com as exigências regulatórias. Depois há o pormenor que estes taxis vão ser propriedade e operados por privados que é algo de novo e para o qual não há legislação ou regras. Será necessário convencer com dados as autoridades locais e federais para que sejam dadas autorizações de funcionamento - neste ultimo ponto percebemos porque Musk andar a fazer campanha por Trump: se este vencer, aposto que com alguns milhões no bolso do jesus laranja essas barreiras desaparecem por magia.
Robots chegaram?
E depois vieram os robots Optimus, que Musk garante irá poder fazer todas as tarefas coo limpar o pó, babysiting e até (citando Musk) "ser o teu amigo". E tudo por apenas 20.000 dólares. E impressionaram muitos os fãs enquanto dançavam, interagiam com fãs e até tiravam bebidas.
O problema é que aparentemente eles estavam a ser controlados remotamente - segundo a Electrek um dos fãs de Musk chamado Robert Scoble que esteve presente falou com um dos engenheiros da Tesla e segundo ele a inteligência artificial apenas servia para os robots se moverem, o resto eram humanos algures a controlar. Basicamente o que a Disney e muitos outros já fazem há anos em parques de diversões.
Concluindo
Então porque ê que Elon Musk montou todo este teatro? Musk e o mercado considera a Tesla uma empresa de tecnologia, não um construtor automóvel, e como tal há que inventar algo de novo para assegurar o valor das acções - como recentemente todas as empresas andavam a enfiar inteligência artificial em tudo. A fortuna e poder de Musk dependem de manter o valor das acções elevado, mas parece que enfim o mundo fora do culto de personalidade de Musk está enfim a cheirar o ar quente.
update 30-10-2024
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