Condução autónoma - o fim do automóvel

Juro que não é mais um artigo sobre como os sistemas de condução autónoma vão acabar com o prazer da condução ou com aqueles automóveis que todos sonhamos - eu estou a falar do fim do automóvel mesmo, ponto final paragrafo. E eu sei quem é o culpado - o meu irmão. Ok, para ser mais exato caramelos como o meu irmão, saudáveis que andam de bicicleta por todos o lado - já volto para explicar este ponto em detalhe mas comecemos com os sistemas de condução autónoma.

Todos nós já vimos pelo menos um daqueles vídeos de palestras ou demonstrações de pessoas de tecnologia a falarem sobre como a tecnologia é ótima a pessoas que adoram tecnologia. Conhecem o tipo - com a gola e óculos à Steve Jobs, o mais recente iPhone algures no bolso e todos dizem mais ou menos o mesmo sobre futuro sorridente que será a condução autónoma: como o condutor é o componente menos fiável, como os nossos filhos ou netos não vão ter que conduzir ou mesmo aprender a conduzir um automóvel. O que até soa bem: quem é que não quer deixar de se preocupar com encontrar estacionamento, ou se o idiota que segue perto demais está bêbado ou nunca mais haverem acidentes de automóvel. Imaginem o fim daquelas tristes estatísticas que temos no fim de cada período de férias em que nos apercebemos que algures neste pais, talvez na porta ao nosso lado, uma família chora a morte de um ou mais entes queridos.

Mas algo me apercebi: os sistemas de condução autónoma são um cavalo de troia que ira levar ao fim do automóvel. Para explicar o que quero dizer vou usar a teoria do dissuasor - ou porque é que certos conflitos dão em guerra e outros arrefecem.

Quando há informação completa ou/e se sabe exatamente tudo sobre ambos os lados de um conflito ambos sabem o custo de entrarem em conflito e não há oportunidade de bluff e não há conflito porque ambos os lados sabem o que aconteceria se entrassem em guerra. Basicamente se eu for racional e se você for racional, e eu souber as suas intenções e capacidades e tu as minhas, então não vamos entrar em guerra. Nenhum de nós será capaz de chantagear ou intimidar. Um pouco como o estado atual das superpotências nucleares: um diz "vou-te arrasar com armas nucleares" com o outro a responder "Não não vais. Não vais destruir o mundo lá porque eu atravessei uma linha no mapa".

Mas há uma falha nesta teoria - e se um dos lados não for bom da cabeça?

Não completamento doido ou louco, basta ligeiramente irracional - queres muito algo e estás pronto a pagar um preço insano para o conseguires. Se fores um pouco maluco assustas qualquer um porque não sabemos se estas disposto a arriscar milhões de mortos para conseguires o que tu queres - na atualidade pensem num certo senhor Putin, Trump ou até Hitler. É uma vantagem se um dos lados conseguir dar a imagem de que é "um pouco louco" - somos capazes de conseguir o que deseja nas negociações. Voltando ao exemplo de Putin este sempre disse que queria "devolver a Rússia à grandeza de antes" e todos sabem disso, dai que quando ocupou parte Ucrânia o mundo saltou mas não o suficiente para o chatear, apenas para fazer pose de força onde ele parou porque afinal "ele é um pouco doido".

E se aplicar-mos os dissuasores à nossa vida diária, em particular aos cálculos mentais que fazemos todos os dias?

Perguntem-se: porque é que como peões não nos colocamos à frente de automóveis na estrada? Não porque os condutores são emocionais ou loucos, mas porque eles podem estar mais interessados no telemóvel, a mandar vir com os filhos no banco traseiro, algo mais que que ver o que está à sua frente. Por isso é que simplesmente não atravessamos a rua sem mais nem menos, porque há aquele dissuasor: será que ele está mais interessado noutra coisa?

Há uma razão pela qual quando vamos a conduzir numa estrada não temos ciclistas, peões, corredores a competirem pela estrada - eles têm medo de nós. E porque? Porque somos emocionais, ligeiramente doidos e num confronto o "um pouco louco" tem a vantagem.

Mas e se não for um ser humano a conduzir, se for um destes sistemas de condução autónoma a conduzir? Eles não têm emoções, não enviam selfies, não conduzem com os joelhos enquanto lê o jornal ou chateia-se com os outros condutores porque conduzem como idiotas! Não mostra o dedo, não insulta ou tem "road rage" - é viver e deixar viver. No mundo da condução autónoma o automóvel não é o louco. Não...esse papel passa para a pessoas fora do automóvel!

Se fores um ciclista, peão, corredor e acreditas de que os os automóveis autônomos vão parar sempre e dar-te passagem sempre então não há nada que te impeça de o fazer. Certamente conhecem o jogo do "Chicken" dos filmes americanos - atualmente temos um jogo de "Chicken" entre condutores e ciclistas, cada um a desafiar o outro para fazer algo de estupido mas se a condução autónoma vingar as regras do jogo mudam.
Se soubermos que o outro jogador (neste caso o automóvel) é mais certinho, cuidadoso, dado a cumprir as regras então as pessoas fora do carro ganham - no jogo do "Chicken" o mais louco tem a vantagem.

No mundo da condução autónoma as posições invertem-se, o automóvel é agora completamente são de mente e racional mas isso permite aos peões serem os imprevisíveis, dá-lhes um incentivo a serem imprevisíveis: quanto mais imprevisíveis e flagrantes na violação das regras forem o sistema autónomo mais dificuldades terá em perceber o que está a acontecer e agir em conformidade.

Em completo estilo Thanos se pudéssemos estalar os dedos e todos os carros passassem a ser autónomos teríamos bloqueio completo assim que os peões se aperceberem do poder que detêm! Como é que os automóveis se movimentariam na cidade? Simples, não sairiam do sítio. Miúdos poderiam jogar à bola no meio da rua, matilhas de ciclistas podem ir pela A1, resolve atravessar uma estrada de várias faixas simplesmente porque viu um amigo do outro lado...e os automóveis autónomos vão todos simplesmente parar e pacientemente esperar até que eles resolvam ir-se embora.
Eles, aka "os caramelos como o meu irmão", recuperam a estrada mas nós não iremos a lado nenhum...

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